O paradoxo da escola

Virginia Machado
A minha relação com a escola tem sido paradoxal. Vejo seus problemas e vislumbro soluções. Mas estas visões estão em lados diferentes. Estou sempre querendo acreditar nas possibilidades utópicas e ao mesmo tempo me confrontando com problemas que parecem nascidos para não ter solução. Vemos que ali, no chão da escola, no cotidiano vivenciado pelos seus habitantes efetivos – a comunidade escolar – é bem diferente daquele bebericado pelos envolvidos temporários. Os temporários somos nós, as gentes da universidade.
Se queremos o melhor para a escola, e por isso nos desgastamos e investimos tempo de pesquisa e estudo sobre a sua dinâmica, também somos cientes dos limites cada vez mais endurecidos pelo acréscimo de variáveis que ampliam as redes complexas. A dinâmica dessas redes as aproxima e em suas intersecções móveis produzem-se outros paradoxos. Muitos deles imperceptíveis aos observadores desavisados. Dinâmica é coisa difícil de apreender. Tentamos aprendê-la nos detendo nas partes, tentando juntá-las em algum momento de nosso descanso, mas as oscilações desse sistema, que se regularizam em dado tempo de observação, são engessadas pelos observadores de diferentes lugares e levadas a sobreposições e estigmas difíceis de serem deslocados a níveis hierárquicos de maior ou menor importância, quando se analisa determinado evento contextualizado nessa dinâmica.

E o tempo? O tempo para as reflexões e encontros é cada vez mais escasso e não paramos nem para perceber isto. Tudo isto está envolvido pela modernidade acelerada.

Queremos que nossos pupilos imediatos, nossos alunos e alunas da universidade, tenham boas experiências, para fundarem suas crenças em possibilidades de transformação daquele cotidiano e das estruturas que sustentam os movimentos. Lembremos que Educação é movimento. Queremos outros movimentos que despertem nos envolvidos a visão dos limites da passividade, da acomodação, da desesperança. O ser humano não chegou até aqui sendo acomodado. Ao contrário, foi a insatisfação e a desacomodação, a reflexão crítica que emergia da busca por clareza, aprofundamento e necessidade de ver largo, longe, que mobilizou correntes de seres aventureiros, argonautas e sertanejos de veredas, sonhadores, homens e mulheres teimosos, amantes do risco, a desenvolver modos de ver o mundo e de fazer coisas para aperfeiçoá-lo. Tudo fez e faz parte do processo civilizatório em constante movimento, dinâmico e complexo.

Fico muito preocupada com nossa juventude. Fazer o quê? Fico mesmo. Onde estão os amantes do risco? Onde está a crença? Esse mundo acelerado não espera mais pelas boas novas. Ele adianta relógios físicos e mentais, se enreda e passa por cima das petúnias recém plantadas, sem olhar para trás. Nossas crianças marcham diariamente para a fábrica de fazer problemas sem solução? Isto sempre me faz lembrar o livro ‘A revolução dos bichos’. Li quando cursava Pedagogia.

Estamos acorrentados em nossos sonhos querendo encontrar soluções para coisas que não têm solução, principalmente se continuarem a ser vistas do mesmo ângulo. Alguém plantou o tripé do binóculo de lentes vencidas e ninguém se anima a mudá-lo de lugar e a ajustar suas lentes. Penso que isto se dá principalmente porque, aqui, na universidade dos sonhadores e caçadores de problemas alheios, não sabemos fazer nem a metade do que a escola faz, mesmo com todos os seus problemas, se mostrando assim tão problemática. Tão escancarada e indefesa aos paparazis de ocasião. Nós, aqui da universidade, não sabemos reconhecer que também temos problemas. Se o fizéssemos, aí sim veríamos outros tantos paradoxos, onde problemas e soluções andam em lados opostos.

O que fazer? Pra começar, parar para pensar. E não ter tanta pressa de emitir impressões sobre o que observamos.

Cadê o espaço? Cadê o tempo? Tenho investido em fazê-los, porque não me agrada ficar por aqui só de assistente das problemáticas, fingindo que me preocupo, sem tentar ver as coisas de outros ângulos para minimizar os paradoxos ditos da escola, mas que também são da universidade.